quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O DEVOTO CHICO.

COISAS DE SANTO ANTÔNIO DE ANLENQUER
O devoto Chico

Caboclo moreno, solteiro, estatura média, esperto, Chico vivia por viver, mas era companheiro fiel nos trabalhos rurais do agricultor Rivail Figueiredo, de quem era afilhado. Não sei se chegou a acalentar algum sonho, a lembrança que tenho dele é de uma criança num corpo adulto sempre sorridente...
Por sua vez, o agricultor era casado, antes tinha sido seminarista, exemplar chefe de família, católico fervoroso desses de assistir Missa com adoremus na mão, e cidadão respeitado em Alenquer, onde tinha a fama de caçador e excelente atirador de rifle 22, a uma distância de 30 metros não errava alvo algum. Era um homem destemido, pacífico, um idealista...
Num certo dia do mês de março, tempo chuvoso dos idos da década de sessenta do século passado, estavam os dois no retiro São João. Após cansativo dia de trabalho na lavoura de tomate, Chico avisou ao padrinho, que ía comprar tabaco e abade numa taberna que ficava a uma certa distância na estrada que liga os retiros São Francisco, do Luis Martins, e o Santa Cruz, do Azaury Valente, e segue para o Cuipéua. O São João é o ponto intermédio entre os dois retiros. Rivail sabia que o afilhado era chegado a uma pinga e, vez por outra, abusava da malvada.
A noite arriou de vez, o tempo continuou fechado, com relâmpagos alumiando a mata até bem longe, e nada de Chico voltar. Cansado de esperar pelo afilhado, Rivail adormeceu.
Por volta de meia noite, Rivail acordou ouvindo urros de onça. Sobressaltado, pulou da rede e foi ver se Chico tinha chegado. Nem sombra. Preocupado, pegou a lanterna, o terçado na bainha, a cartucheira 44, botou o chapéu de palha na cabeça, e rumou para a taberna sob o céu fechado.
Ainda não estava na metade do caminho e Rivail encontrou o afilhado estirado no tronco de um ingazeiro, totalmente bêbado, cantarolando uma cantiga que só ele mesmo entendia.
- Que vergonha, Chico, falou rispidamente Rivail, se eu soubesse que era bebida que estava causando a tua demora, eu tinha deixado a onça te comer!...
- Eu conheço seu coração, padrinho, respondeu Chico tropegamente levantando-se do tronco da árvore, quando senti que não me aguentava mais em pé e ouvia o urro da onça chegando mais perto, pedi pra Santo Antônio lhe acordar e que depressa viesse me socorrer...
Dias mais tarde, Rivail matou a onça que andava atormentando os moradores da redondeza...
Este fato me foi contado pelo meu primo Waldinor Batista. Aliás, hoje, estes três personagens Rival, Chico e Waldinor são falecidos. Que Deus os tenha em seu aconchego de misericórdia e luz!...

Diácono Eliezer Martins
Arquidiocese de Belém, Pará, Amazônia do Brasil

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