quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

PARABÉNS PARA BELÉM DO PARÁ.


Uma Belém além da poesia


A cidade vive, ao mesmo tempo, um clima nostálgico dos tempos áureos do ciclo da borracha e a urbanização não planejada, e clama por uma nova Belle Époque

No dia 12 de janeiro a cidade de Belém completará 396 anos. São muitas as denominações que a cidade ganha e que são fortalecidas durante o período do seu aniversário, através de homenagens em tons poéticos. Há, porém, quem diga que muitos desses "jargões" não cabem na lista de denominações da cidade, como a estudante de Engenharia Sanitária e Ambiental, Bárbara Lúcia dos Anjos. "Viajando por outras capitais, eu percebi que Belém está muito atrasada", diz ela. "Belém parou no tempo. Tudo que a cidade tem hoje em questão de infraestrutura é graças à Belle Époque. Não há nada de novo", acrescenta.

São quase 400 anos de história. Durante esse período, Belém viveu momentos de plenitude, entre eles, o período áureo da borracha, no início do século XX. Nessa época, Belém recebeu inúmeras famílias europeias, o que veio a influenciar na arquitetura de suas edificações, ficando conhecida na época como a "Paris n'América".

Hoje, apesar de ser cosmopolita e moderna em vários aspectos, Belém não perdeu o ar tradicional das fachadas dos casarões, das igrejas e capelas do período colonial. A cidade é mundialmente conhecida e exerce significativa influência nacional e até internacional no que se refere à cultura, à econômia e à política. Fazem parte do cenário de Belém importantes monumentos, como o Theatro da Paz; museus, como o Museu Paraense Emílio Goeldi; e parques e complexos, como o Ver-o-Peso. Além disso, eventos de grande repercussão como o Amazônia Fashion Week, o Círio de Nazaré, a Feira Pan-amazônica do Livro e o Festival Internacional de Música inserem a cidade na lista de capitais que realizam grandes eventos.

Bárbara Lúcia se diz "apaixonada" por sua cidade. "Apesar de amar Belém, reconheço que é uma capital com muitos problemas e atrás de muitas outras", avalia. "Belém parece uma cidade sem prefeitura", afirma, comparando com outras cidades. A representante comercial paranaense, Roseli Cruz, que mora há 15 anos em Belém, faz a mesma avaliação. Segundo ela, a população não respeita a sua própria cidade e possui maus hábitos como o de não contribuir com a limpeza e organização da cidade. "Belém é muito bonita, mas é mal cuidada tanto pela prefeitura quanto pela população", diz.

De acordo com Roseli, desde que se mudou para Belém, percebeu mudanças na cidade. "Antes era tudo muito rústico aqui e eu vi que a cidade deu um salto, mas isso é natural. Toda cidade tem que evoluir", diz. Ao comparar com o desenvolvimento de outras capitais, inclusive a capital do estado vizinho, Manaus, Roseli diz que Belém está sempre um passo atrás. Atualmente, Belém conta com apenas duas obras expressivas - a macrodrenagem da bacia da Estrada Nova e o Portal da Amazônia.

Igreja já foca os 400 anos

Para o Bispo Arquidiocesano, Dom Alberto Taveira, "é sempre uma alegria comemorar o aniversário de Belém". A história da cidade está relacionada com a presença da Igreja em "terras amazônicas". É por isso que, desde 2007, a Arquidiocese de Belém segue com os preparativos para a celebração dos 400 anos de evangelização da Amazônia, relacionada com a própria história da cidade.

"Celebraremos os 400 anos da presença da Igreja aqui na Amazônia, a fundação de Belém e o início da evangelização. Por isso, nós queremos marcar cada dia 12 de janeiro como um grande evento", comentou o coordenador de pastoral da Arquidiocese, Monsenhor Raimundo Possidônio.

Dom Alberto informou que a Arquidiocese já fez todo o planejamento do Congresso Eucarístico Nacional, um grande evento que ocorrerá em Belém em 2016, mesmo ano em que Belém completa 400 anos. De acordo com ele, ao longo de 2012, a Arquidiocese deverá trabalhar ainda mais em prol da programação dos 400 anos. Todas essas programações previstas para 2016 prometem ser um marco tanto para a história da cidade quanto para a Igreja de Belém.

A Belém do século XXI precisa de uma nova Belle Époque

Belém vivenciou momentos de luxo e glamour na Belle Époque, que significa "bela época" em francês. Ficou conhecido assim o período da Era da Borracha ou Ciclo da Borracha. Esse sistema econômico fez com que Belém fosse considerada na época a cidade brasileira mais desenvolvida e umas das mais prósperas do mundo, não só pela sua posição estratégica - quase no litoral -, mas também porque sediava um maior número de residências de seringalistas, casas bancárias e outras importantes instituições.

Costuma-se relacionar vários aspectos contemporâneos da cidade com o período da Belle Époque. O próprio nome em francês faz referência a um período de cultura cosmopolita na história da Europa. Belém teria vivenciado um retrocesso, comparando a "bela época" e os dias de hoje? Esta pergunta faz parte do conjunto de discussões que norteiam muitos órgãos, grupos e setores da sociedade.

No apogeu da Belle Époque, entre 1890 e 1920, a cidade contava com tecnologias que outras cidades do sul e sudeste do Brasil ainda não possuíam. Hoje, porém, Belém consta na lista das capitais mais atrasadas do país, em vários aspectos. A cidade que teve alguns dos principais empreendimentos arquitetônicos do mundo construídos naquela época, presencia hoje a degradação dessas estruturas e o descaso do poder público pelo verdadeiro valor que essas construções representam para a sociedade.

A cidade que teve um dos primeiros cinemas do país - o Olympia, hoje o mais antigo do Brasil ainda em funcionamento - considerado um dos mais luxuosos e modernos de seu tempo, inaugurado em 1912, no auge do cinema mudo internacional, mantém atualmente um Olympia com poucas exibições e que abriga moradores de rua sobre sua marquise.

O Theatro da Paz, inspirado no Teatro Scala, de Milão, é considerado um dos mais belos do Brasil. O complexo do Ver-o-Peso, principal cartão postal da cidade, abriga a maior feira livre da América Latina, e as arquiteturas do Palácio Antônio Lemos, do Tribunal de Justiça do Estado, do Museu do Estado e da Catedral Metropolitana de Belém impressionam pela grandiosidade e riqueza de detalhes. A Praça Batista Campos é considerada uma das mais bonitas do Brasil. "Mas tudo isso veio daquela época. O que temos de novo?", questiona Bárbara Lúcia. "A Belém do século XXI precisa de uma nova Belle Époque", afirma.

De acordo com o arquiteto e coordenador do Fórum Landi, Flávio Nassar, o patrimônio histórico da cidade está "abandonado". Ocorrem apenas manutenções em prédios isolados, mas a maioria está abandonada. Ele explica que Belém viveu dois grandes períodos de destaque nos quais a cidade ganhou importantes infraestruturas patrimoniais - o primeiro foi o do século XVIII, conhecido como período Pombalino e que Belém ganhou arquiteturas de Landi como a Catedral, o Palácio do Governador e grandes igrejas como a de Sant' Ana e de N. S. das Mercês. O segundo período foi o da borracha, no qual Belém viu a construção da Basílica Santuário e a reforma da Catedral. "Belém nunca mais se encontrou depois da borracha", afirma Flávio Nassar.

Segundo Flávio, a cidade surgiu sem planejamento urbano e estratégico. "Não se pensou Belém", explica. Para ele, a capital paraense entrou na lista de cidades importantes que entraram em decadência. "Belém não foi capaz de se organizar. A última geração de paraenses não foi capaz de pensar um destino para Belém", esclarece.

Flávio diz que "em nenhuma outra época a capital paraense esteve tão abandonada como atualmente" e revela o motivo daquilo que ele considera "atraso da cidade" - "falta um plano estratégico para Belém. Falta se pensar um modelo para a cidade e dizer 'nós pensamos um futuro para Belém assim, desse jeito'".

"O que sonhamos para Belém? Queremos uma cidade caótica e cheia de pobreza ou queremos uma cidade mais limpa e reconhecida como um povo mais cristão e devoto? Isso é planejamento", explica Flávio Nassar. A ausência de planejamento estratégico também é apontada pelo engenheiro civil, professor universitário e ex-presidente do CREA-Pa, José Leitão Viana. Para ele, Belém viveu todo o século XX em função das obras de Antônio Lemos. "Não se criou estradas novas. Em relação a trânsito, a cidade está parada", avalia.

De acordo com o engenheiro, muitas obras que resolveriam o problema de infraestrutura da capital não foram em frente. "Se tinha o projeto ideal para resolver o problema do Entroncamento, por exemplo, mas ele não foi em frente", informa. "Falta infraestrutura aqui. A cidade conta com apenas uma via de acesso e saída da cidade, que é a BR 316. Quando se extinguiu a estrada de ferro em 1964, não se fez mais nada em relação à infraestrutura", explica.

Viana também esclarece que Belém está sempre atrasada porque demora-se a pensar e executar as obras. Quando elas finalmente estão sendo concluídas, a cidade já necessita de outras. "A vida de uma cidade não é estática. Precisa-se sempre de novas soluções. Essas obras que vão iniciar agora, por exemplo, vão resolver o problema até um certo tempo", justifica.

Fonte: Fundação Nazaré

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