segunda-feira, 26 de abril de 2010

PAI MISERICORDIOSO - FILHO PRÓDIGO

Por Dom Alberto Taveira Corrêa*

A parábola do Filho Pródigo ou do Pai Misericordioso é tão conhecida que imediatamente nos recorda inúmeras histórias de jovens “descabeçados” que partem pelo mundo. Em nosso Brasil, há muitas experiências de instituições que se tornam sinais da misericórdia do Senhor para com tais pessoas. Uma delas, presente em quase todo o país e em outros países, se chama “Fazenda da Esperança”. No próximo dia 22 de março, como último ato como Arcebispo de Palmas, celebrarei a Missa de ação de graças pelos dez anos de nossa Fazenda da Esperança. Todas as semanas, Deus me deu a graça de estar com eles.

Toca-nos profundamente o coração encontrar ali pessoas que efetivamente não têm mais nada a perder, pois jogaram fora até a p rópria dignidade. Mas constatamos, acompanhando-os de perto, que há uma luz que não se apaga, a capacidade de amar. Há dentro deles, moças e rapazes, e muitas pessoas adultas, uma sede profunda que é o sinal do amor de Deus, como um imã poderosíssimo, que os atrai para o Evangelho.

E basta uma palavra para recomeçar o caminho, empreender a corajosa volta para o Pai. Para muitos bastou viver um dia a palavra “Vou voltar para meu pai” e tudo ficou novo no coração e em volta deles. Outros se converteram radicalmente porque alguém lhes disse com a vida “Este meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado”.

E o caminho é simples, ainda que exigente, pois feito para pessoas ousadas: Viver o Evangelho, uma palavra a cada dia, sair de si para amar o próximo, partilha das experiências da Palavra. Tudo isto fecundado pela Eucaristia e pela Oração.

Quando se descobre o amor de Deus, nasce em nosso coração uma imensa saudade, saudade de Deus! Saudade de quem está mais perto do que se pode pensar, saudade do amor que nos acolhe. E começa o caminho de volta, para encontrar o Pai que não se cansa de olhar, na curva da estrada, aguardando o retorno do filho. O Pai tem sede de abraçar e de perdoar!

A parábola que ouvimos é como um cabide, no qual podemos dependurar a roupa - a vida! - que quisermos. É uma história em que entram dois filhos que igualmente entristeceram seu pai. Os dois se mostram duros com ele, ignorando sua bondade, um pela desobediência, outro “apesar” de sua obediência. Não há na parábola um terceiro filho e nós somos obrigados a descobrir que somos um ou outro, ou um e o outro.

Mas também o pai é singular, um pai que não se preocupa com sua própria dignidade, que não faz nada para opor-se ao capricho insolente e estúpido do filho mais novo. É um pai que com o filho mais velho não se decidiu dizer “quero”, “entre para a festa”. Parece que não soube educar seus filhos!

É que não nos encontramos numa casa da terra. Este pai que pede ao invés de mandar, que dá e não sabe dizer não, que perdoa no lugar de castigar não tem outro igual aqui em baixo, é o nosso Pai do Céu, cujo nome conhecemos: Deus é Amor.

O amor é a única lei da casa do Pai. Mas o amor tem por condição a liberdade. Não há ser humano que possa ser obrigado a amar. Deus, que nos ama e porque nos ama, e porque espera de todos nós o amor, e não quer de nós outra coisa senão o amor, correu o grande risco do amor e, para nós, o grande risco da liberdade com que nos criou.

Temos este prodigioso e triste poder de negá-lo ou de regatear o amor de Deus. Esta é a história dos dois filhos da parábola, a história do pecado, a nossa história. O filho menor abandonou o pai não porque desejasse uma vida dissoluta, mas porque não queria continuar obedecendo ao pai, queria ocupar o lugar do pai. Seu pecado começou quando deixou de amar o seu pai acima de tudo. O pecado é uma rebelião de nosso eu contra Deus.Depois do pecado do rebelde e infiel, vem o pecado discreto, insuspeitável, o pecado da maioria de nós que aqui estamos, o pecado do filho mais velho, que era modelo de obediência. Certamente foi citado muitas vezes como exemplo e consolo do velho pai. Tudo perfeito, se um incidente não pusesse a nu seu coração. É mais ou menos assim. Quando se fala de pecadores, muitas vezes vocês e eu pensamos em outras pessoas. E aqui está a ocasião, quem sabe inesperada, para nos reconhecermos também pecadores, carentes da misericórdia. Os santos sabiam que eram pecadores e diziam isto com frequência, pois eram conscientes de sua situação. Sem dúvida, Deus oferece a cada um de nós oportunidades semelhantes àquela do filho mais velho, esperando pacientemente que entremos para a sala da festa, sem exigências, apenas para amar.

Hoje é dia da alegria, dentro de nossa caminhada quaresmal. Nesta semana, é bom confrontar com o Senhor nossas idas e vindas, nossas crises pessoais, nossos sonhos e aventuras, o abraço do Pai e a Festa da Reconciliação.

Aqui, na festa da Eucaristia, o Senhor nos acolhe e nos pede hoje arrependimento, conversão e disposição para recomeçar.

* Administrador Diocesano da Arquidiocese de Palmas - Tocantins e arcebispo eleito de Belém do Pará.

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