terça-feira, 2 de março de 2010

"A velhice sob a ótica dos jovens"


A VELHICE SOB A ÓTICA DOS JOVENS
Psicóloga Lúcia Abreu
Há muito tempo venho lidando com jovens, quer no consultório quer em aulas de orientação sexual ou na escola. Durante todo este tempo, uma atitude dos jovens vem me impressionando sobremaneira: a forma como eles se referem aos velhos. Fico curiosa tentando entender o que é que os leva a ver da maneira que vêem a velhice e, ao mesmo tempo, sinto-me entristecida ao ver este tipo de preconceito presente em grande parte de nossa juventude.
Em consultório, no mais das vezes em que algum adolescente comenta sobre pessoas idosas, este comentário de forma alguma vem acompanhado de uma atitude de respeito ou de gratidão. Pelo comentário, os jovens tendem a olhar para os velhos como se olha para algo que não tem mais o menor valor, algo que já deu o que tinha que dar e que, por isto, é desprezível.
Sei que alguns vão argumentar que isto é típico da juventude desde os tempos imemoriais pois os jovens estão começando um caminho já trilhado pelos velhos e, inconscientemente, os jovens sabem que o caminho terá por fim a velhice. Desprezar os velhos seria, assim, a forma de negar a possibilidade do fim da juventude, sendo uma manifestação da tão falada onipotência adolescente. Rejeitando os velhos, os jovens rejeitam a velhice que começa a nascer neles próprios.
Não nego que este tipo de argumento tem lá sua dose de razão, mas penso que ele é por demais simplista. Este tipo de explicação é parcial e alienante, como a maioria das explicações sobre ser humano que não levam em conta o contexto em que uma ação se dá, como se nós pudéssemos ser apenas parcialmente sociais.
O tempo passa e, o olhar cultural vai buscando novo foco, principalmente depois do advento da informática. O futuro passa a chamar a atenção do olhar cultural, pois é lá que as coisas acontecerão, é lá que terá resultado o esforço social de hoje. O jovem passa a ser o referencial, na medida em que nele está a necessária agilidade para acompanhar os passos do progresso humano. Novas profissões surgem, fazendo com que nem os pais nem os avós possam ser parâmetros para uma escolha de atividade profissional. O critério do jovem para a escolha profissional está principalmente na tentativa de previsão sobre como estará o mercado de trabalho daqui a algum tempo, vale dizer: no futuro.
Cheios deste novo poder, os filhos enfrentam, ativos, os pais que, indecisos e cheios de psicologismos, não sabem como se fazer respeitar, deixando de sinalizar aos jovens os importantes limites que a vida nos impõem e com os quais só com o tempo aprendemos a lidar sem necessitarmos de uma assessoria mais experiente.
Quero terminar dizendo que de forma alguma penso que seja privilégio dos jovens este descaso para com as pessoas da terceira idade, este descaso para com o passado. Isto está presente em todos nós. Os jovens somente são mais ingênuos e mostram mais claramente aquilo que com o tempo vamos aprendendo a disfarçar cinicamente.
A autora é psicóloga com especialidade em terapia de casal e família.
E-mail – lmt@oi.com.br

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