quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

"Viver a dois: Uma eterna construção"

VIVER A DOIS: UMA ETERNA CONSTRUÇÃO

Psicóloga Lúcia Abreu
Especialista em terapia de casal e família

Mesmo em tempos de grandes transformações sociais, como a que vivemos, a grande maioria das pessoas continua se casando com a expectativa da indissolubilidade, de permanência no tempo, da vontade de compartilhar a própria história.
Tornar-se casal é uma das mais complexas e difíceis transições do ciclo vital e não ocorre automaticamente com a cerimônia do casamento. A formação do casal pode levar anos e pode até mesmo não ocorrer. Há casais que se separam sem nunca terem estado casados. O casamento além de ser um grande desafio é ao mesmo tempo mais do que um rito de passagem. Termina uma etapa da vida e assenta-se sobre um mito: “ e viveram felizes para sempre.
Paradoxalmente, portanto, o casamento bem sucedido caracteriza-se como um processo de contínua mudança com a concomitante renegociação de expectativas e acordos. Logo, a necessidade de um bom relacionamento conjugal pressupõe mudar para continuar a existir. E, o equilíbrio entre o que manter para garantir a continuidade do casal e o que abandonar, transformar ou criar para fazer frente às exigências que surgem a cada etapa da vida, ameaçando a relação, caracteriza o casamento como um sistema em constante revisão e reconstrução.
Ser casal supõe a existência de complementaridade e acomodação nos planos sexual, afetivo e econômico. O que envolve um mútuo dar e receber no dia-a-dia, com espaço para diálogo, diferenças, criatividade e trabalho. Portanto, envolve um EU e um TU, assim como precisa preservar o espaço para a coexistência do que é individual de cada parceiro e do que é conjugal. No entanto, a convivência diária traz para dentro da relação uma realidade muitas vezes parcial ou totalmente desconhecida. Desse confronto com a realidade frequentemente surgem conflitos, gerando crises. Mas acontece que as crises não acusam o fim do casamento. Pelo contrário, as crises são importantes e saudáveis para o desenvolvimento da relação conjugal, pois dão a oportunidade de cada um perceber o outro e a si mesmo com mais realismo e poder ter expectativas mais reais para a relação.
Perceber que o outro não faz parte de si mesmo é fundamental para que a relação amadureça e se construa com base no amor. É importante que o casal tenha conhecimento que o amor surge com a convivência, que ninguém ama de imediato. O casamento pode ser uma relação aberta ao crescimento, na medida em que permitir reconhecer e superar crises.
Um aspecto importante no casamento é o afeto e o amor. A maioria dos casais espera manter esse sentimento ao longo da vida e a não existência tem sido considerada a maior razão para a dissolução da relação. No entanto é comum que ocorra uma perda gradual da ligação afetivo-amorosa, com um declínio do cuidado pelo outro. O afeto pode vir a ser substituído por um afeto neutro. O amor, não consegue continuar igualmente ao de quando o casal se conheceu. Esses dois sentimentos, ao longo de sua existência também sofrem modificações. No entanto, para a continuidade da relação, numa qualidade satisfatória, é como se, a cada etapa da vida, o casal tivesse que se redescobrir, se escolher e se casar novamente, tantas vezes quantas forem renovadas as bases do vínculo amoroso que os une. Se a relação do casal solidificou-se ao longo dos anos, essa é a hora de desfrute e de reinvestimento no casamento.
A autora é psicóloga com especialização em terapia de casal e familiar.
E-mail lmt@oi.com.br

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