quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Onde é que a familia falha?

ONDE É QUE A FAMÍLIA FALHA?

Psicóloga Lúcia Abreu



Uma pergunta freqüente neste momento de muita mudança, de muita dúvida com relação aos valores, é como está se saindo a família na educação dos seus filhos; o que está marcando a relação dos pais com suas crianças e adolescentes. Preocupações com a possibilidade de que os filhos se envolvam com drogas, promiscuidade sexual e que os filhos não estejam preparados para a competição profissional no futuro fazem parte da rotina dos pais.
Como contrapeso ao medo de que os filhos fujam ao controle dos pais, vêm os planos, as expectativas de sucesso. Há pais capazes dos maiores sacrifícios, para manter os filhos em escolas “fortes” que lhes garantam a entrada em uma faculdade. Em função das expectativas dos pais a criança, às vezes, não tem nem tempo para brincar. Porque passa o dia entre a escola, a aula de reforço, a aula de computação e por aí a fora.
Preencher de maneira “útil” o tempo das crianças apazigua o temor dos pais de que elas fiquem “vagabundas”, irresponsáveis se deixadas por conta própria. De que, ao chegar à fase adulta, não cultive nenhum interesse e não venha a ser bem sucedida profissionalmente. Em tudo isso não vai nenhuma crítica aos pais, cuja tarefa de educadores hoje é dificultada pelo conflito de valores em que vivemos, e por um consumismo cada vez mais exigente. Só que eles ficariam mais tranqüilos se considerassem que o jovem entra no círculo da droga quando lhe é mais fácil apropriar-se dos valores do grupo que o induz a consumi-las do que apropriar-se dos valores que a família lhe oferece. É só quando a família não tem força de atração para lhe passar seus valores que os valores do outro grupo ficam mais atraentes.
Onde a família falha? Por exemplo, na atribuição de responsabilidades que dêem ao filho o sentido de seu próprio valor. Pouquíssimas crianças e jovens têm responsabilidades em casa; pouquíssimos são vistos, no contexto familiar, como indivíduos com alguma contribuição a dar na vida da família. Desde pequena a criança se acostuma a ser servida o tempo todo, a contar com uma mãe que se esfalfa levando os filhos de uma atividade para outra, enquanto o pai arca com o custo enorme dessas atividades. Ela, a criança, parece existir só para ser servida. Sua única obrigação é tirar boas notas na escola e sair-se bem nas demais atividades fora de casa. Muitos dos que enfrentaram dificuldades econômicas na infância e na adolescência, empenhados em dar uma vida melhor aos filhos, só lhe pedem uma coisa: que estudem. Eles não levam em conta que são as trocas – quando também fazem a sua parte no cuidado da casa, dos outros irmãos, do que é de todos – que começam a preparar os filhos para a vida.
Porque é que em nossa sociedade existe uma crise da adolescência? Um dos motivos é por que o adolescente ainda não tem idéia de qual poderia ser sua função social. Esse processo começa em casa, num contexto em que todos têm o que dar e receber, em que todos têm condições de cuidar e ser cuidados.
Por falta dessa base, porque não houve um treino adequado de dar e receber desde a infância, a adolescência muitas vezes se prolonga além da conta em nossa sociedade. O indivíduo já adulto continua achando que merece uma série de regalias, de privilégios, sem precisar dar nada em troca. O que, na realidade, revela um grande medo de assumir a própria vida.
E-mail – lmt@oi.com.br

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